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Direito de reparar: Right to Repair: próximo passo é a criação de um Projeto de Lei Federal no Brasil
O Right to Repair, ou Direito de Reparar, há anos mobiliza o setor de reposição automotiva brasileiro. Representando mais de 80% da manutenção da frota nacional, o segmento vê na regulamentação uma medida essencial para garantir a liberdade de escolha do consumidor e o equilíbrio competitivo no mercado.
No centro dessa luta está a Aliança do Aftermarket Automotivo, que reúne as principais entidades do setor — Andap/Sicap, Anfape, Asdap, Conarem, Sincopeças Brasil, Sindirepa Brasil e Afer — e que, desde a assinatura da Carta de Fortaleza, durante a feira Autop em 2022, incorporou o tema como uma de suas duas grandes bandeiras, ao lado da Inspeção Técnica Veicular (ITC).
O conceito é direto: assegurar ao consumidor o direito de decidir onde reparar seu veículo, obrigando as montadoras a disponibilizar informações técnicas para reparadores independentes. Sem esse acesso, oficinas fora das concessionárias ficam limitadas, comprometendo diagnósticos e reparos, e reduzindo a competitividade no setor.
“O Right to Repair é um movimento mundial, dois estados nos Estados Unidos já são obrigados a liberarem as informações técnicas. Isso é o certo, e nós nos unimos (Aliança do Aftermarket Automotivo) porque se não tivermos força, não conseguiremos disseminar essa ideia para todo mundo se unir no Brasil. Queremos uma legislação que dê direito ao consumidor reparar o seu veículo onde quiser e o acesso às informações para as oficinas independentes poderem fazer o diagnóstico e reparar os veículos”, defendeu Antonio Fiola, presidente do Sindirepa Brasil e Sindirepa-SP.
O posicionamento é reforçado por Renato Fonseca, presidente da Anfape, que vê na união das entidades a chave para enfrentar resistências:
“A Aliança do Aftermarket Automotivo vai proporcionar que a gente enfrente esses e outros problemas complexos de forma organizada e unida. A experiência norte-americana na defesa do direito dos consumidores, na defesa do mercado independente de autopeças, mostra que o caminho é árduo e longo, e nós devemos superar diversas barreiras. Não pedimos nada mais, nada menos, do que o direito de competir. Nós queremos competir e dar ao consumidor o direito de escolha”, explicou.
Rumo à legislação federal
O movimento ganhou apoio jurídico de peso com a entrada da Dra. Raquel Preto, advogada especializada em Direito Tributário, que assumiu a defesa pública da causa no Brasil.
“O Right to Repair ganhou grande projeção no planeta inteiro. Quase a metade dos países desenvolvidos têm alguma regulamentação de Direito de Reparar. É natural que assim seja, quando compramos um carro, um eletrodoméstico ou um eletroeletrônico, temos o direito de consertar e escolher onde consertar. Estamos trabalhando intensamente em uma regulamentação e no reconhecimento legal do Direito de Reparar. Eu tenho fé de que o Congresso Nacional vai ser bastante sensível ao que nós vamos apresentar nas próximas semanas”, afirmou.
O próximo passo da Aliança é apresentar um Projeto de Lei Federal que estabeleça, em âmbito nacional, o acesso às informações técnicas para oficinas independentes, alinhando o Brasil às práticas já adotadas em outros países.
A experiência norte-americana
Nos Estados Unidos, a Auto Care Association, que reúne cerca de 3.000 membros e aproximadamente 1.500 empresas do setor, realizou uma pesquisa com mais de mil oficinas: 63% relataram dificuldades para acessar dados semanal ou diariamente e 51% afirmaram gastar ao menos quatro horas por semana tentando obter informações de veículos — muitas vezes sem sucesso.
Para Bill Hanvey, presidente & CEO da entidade, a restrição é prejudicial em várias frentes:
“Essa barreira à informação técnica causa prejuízos reais ao direito do consumidor e, claro, à sustentabilidade econômica dos players do aftermarket independente dos Estados Unidos. Uma evasão de US$ 3 bilhões nos Estados Unidos, pela impossibilidade de diagnosticar pela ausência de dados”, explicou.
Atualmente, dois estados americanos — Massachusetts e Nova York — aprovaram leis do Direito de Reparar, em 2020 e 2022, respectivamente. A vitória em Massachusetts veio apesar de uma intensa campanha contrária das montadoras, que gastaram mais de US$ 30 milhões tentando convencer consumidores de que a liberação de dados poderia facilitar o roubo de veículos e informações pessoais.
“Apesar da campanha, 82% da população votou a favor do direito de reparar”, ressaltou Hanvey.
Além dos Estados Unidos, a Auto Care Association atua para difundir a regulamentação em países como Canadá, Austrália, Nova Zelândia, União Europeia e, mais recentemente, no Brasil.
Impacto no mercado brasileiro
A aprovação de um projeto de lei nos moldes internacionais tem potencial para mudar a dinâmica do mercado automotivo brasileiro. Com acesso igualitário às informações técnicas, as oficinas independentes poderão competir em condições mais justas, oferecendo serviços de qualidade, preços competitivos e maior capilaridade geográfica — fator essencial para atender uma frota cada vez mais diversificada.
Para o consumidor, o ganho é duplo: liberdade para escolher onde realizar o serviço e garantia de que seu veículo será reparado de forma adequada, independentemente da rede autorizada. Para o setor de reposição, significa ampliar a participação no mercado e estimular a inovação.
Como demonstra o exemplo norte-americano, a caminhada é longa e envolve superar resistências econômicas e políticas. Mas, com união setorial, apoio jurídico e mobilização de entidades e consumidores, o Brasil pode estar mais próximo de ver o Direito de Reparar se transformar de bandeira em lei — equilibrando forças e fortalecendo todo o ecossistema automotivo.
Box:
Impacto esperado no Brasil
- Para o consumidor: mais liberdade de escolha, preços competitivos e ampliação da rede de atendimento.
- Para as oficinas independentes: acesso igualitário a dados técnicos, ampliação de serviços e fortalecimento da competitividade.
- Para o setor de reposição: aumento de participação no mercado, estímulo à inovação e maior capilaridade no atendimento à frota nacional.

Carolina Vilanova, editora da Revista e Portal Oficina News, é jornalista (Mtb 26.048) e trabalha desde de 1996 na imprensa editorial automotiva. Em 2003 iniciou sua participação no mercado da reparação e reposição automotiva, inclusive como editora da Revista o Mecânico por 12 anos. No ano de 2014, idealizou o Portal Oficina News, que em 2016 teve sua versão impressa publicada, a Revista Oficina News, sob a chancela da Editora Ita & Caiana. Sob sua responsabilidade editorial, publica também a Revista Frete Urbano.



