
Reforma não é restauração!
Sim, concordo! Ambas têm o objetivo de trazer o objeto em questão de volta à condição de novo. No entanto, são processos totalmente distintos, cujos resultados apresentam diferenças gritantes. E por essa razão, jamais podem ser confundidos.
A reforma tem como foco a utilidade. Ou seja, modificações e descaracterizações são permitidas, desde que o objeto tenha sua utilidade resgatada. Tomemos como exemplo um automóvel dos anos 80. E não precisa ser nenhuma versão especial, esportiva, ou de tiragem limitada. Um carro normal de série. É claro que esse veículo dispõe de uma série de itens quase que exclusivos para a sua versão (L, SL etc) e ano. Num processo de reforma, cujo resultado deve ser informado previamente ao proprietário do veículo (que deve dar a sua anuência), desde que o veículo volte a funcionar plenamente, se a cor de repintura não for exatamente aquela com que ele foi pintado na fábrica, os tecidos e padrões dos bancos e das laterais das portas tenham sido modificados (os originais não foram encontrados facilmente, ou o preço de aquisição era abusivo) e as lanternas são de um modelo mais novo, não há problema. Essas descaracterizações são aceitas pelo seu proprietário (ou até mesmo propostas por ele), que tem como foco a utilização do veículo.
A reforma não exige grandes pesquisas junto a catálogos, arquivos de fabricantes e fornecedores de raridades. É um processo mais rápido e mais barato. No entanto, não habilita o veículo a vencer concursos de elegância ou obter facilmente um certificado de originalidade. Mas com certeza cumpre o seu objetivo: Dar uma nova vida útil ao veículo.
Já a restauração é um processo diferente. Além de resgatar a operacionalidade do veículo, sua originalidade deve ser preservada, com o maior grau de precição possível. Ou seja, antes de começar a desmontar o carro é preciso fazer um rigoroso trabalho de pesquisa, sobretudo quando se trata de modelos raros e especiais. Desconfiar é a palavra de ordem. E a razão é bastante simples: modelos mais raros podem ser forjados, implantamdo-se determinadas peças sobre modelos básicos. O famoso “parece mas não é”. Um incauto pode investir uma alta quantia sobre um veículo “falsificado”. E fazer isso no Brasil era relativamente facil de se fazer, levando-se em conta que os modelos especiais eram baseados nos básicos (o mesmo carro com uma “roupa” diferente). No entanto, na hora de uma comercialização, participação em concursos ou obtenção de certificados de originalidade as avaliações são bem distintas. Veículos raros corretamente restaurados podem valer milhões. Os falsificados…nem tanto. Ou seja: antes de comprar…pesquise! Revistas especializadas de época, fotos de publicidade, clubes podem ser uma boa fonte de informações. Na dúvida…não compre.
Um verdadeiro restaurador jamais se arrisca a fazer tais alterações, pois pode ter a sua reputação arruinada. Se o veículo é um modelo básico, como básico deve ser restaurado. A correta identificação se faz junto aos números e codificações de chassis que se encontram arquivados nas montadoras. Um bom relacionamento com as mesmas pode ajudar no processo. E não se deixe enganar: Um modelo especial tem sempre tem algo de diferente na codificação (nem que seja um mero algarismo ou letra). Uma fonte de pesquisa confiável são os catálogos de peças, que trazem a decodificação completa do numero do chassi.
No processo de restauração as características mecânicas e de aparência devem ser mantidas 100% originais (desde o tipo de ponteira utilizada no escapamento, passando pelo modelo de roda e pneus, modelo, potência e cor do motor, adesivos, etc). Cada detalhe é de suma importância, fazendo a reputação do restaurador dentro do mercado. Aqui não são aceitas as descaracterizações ou alterações. O uso de peças genuinas é absolutamente preferencial. E quanto mais estiverem presentes no veículo, maior será o seu valor (é preferível restaurar uma peça usada genuína a utiizar uma nova paralela). A cor e a textura da repintura devem ser absolutamente idênticas a original de fábrica. Utilizar tintas mais modernas no lugar das velhas lacas? Um assunto polêmico. Os puristas dizem que não. Outros aceitam, desde que não haja qualquer tipo de diferença entre os acabamentos.
Um veículo restaurado pode ser examinado de ponta a ponta. Nenhum ponto com polimento falho será encontrado. O alinhamento da lataria pode ser verificado com instrumentos de precisão. Nenhum cromado estará sem brilho ou arranhado. Os paineis internos foram refeitos com o mesmo material utilizado nos originais, obedecendo os mesmos padrões. A grade dianteira é daquele modelo e está alinhada e polida. O motor “ronrona” como se tivesse saido da lunha de montagem. Os faróis e lanternas acendem com brilho intenso. A transmissão é macia e com engates precisos. Ruidos estranhos? Mas nem pensar. Os selos de identificação do parabrisa e do compartimento do motor são perfeitos. A serigrafia da tampa do filtro de ar também. Faixas de apliques sobre a pintura perfeitamente alinhados. Todos os acessórios e instrumentos funcionam perfeitamente. É como se o veículo fosse um zero quilometro que acabou de sair da consecionária. Um verdadeiro show de detalhes.
Quanto isso custa? Bem, nesse mundo dinheiro não pode ser problema. Afinal de contas, estamos falando de horas e mais horas de pesquisa, busca em mercados especializados e trabalho de artezões. Custa caro sim, mas o prazer que da dirigir um veículo desses…vale cada centavo investido.
Trabalhar para esse publico? É com certeza muito compensador, pois esse tipo de gente não mede gastos. Mas muito cuidado, trabalhe com absoluta transparencia, pois eles são implacáveis na hora de denegrir o nome de quem os prejudica. E nem pense em começar se não tiver a estrutura necessária.
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Fernando Landulfo é professor nos cursos de engenharia mecânica da FMU, engenharia de produção mecânica da FISP e do curso técnico em automação do SENAI-SP. É engenheiro mecânico formado em 1989 pela UNIP, Contador formado em 2003 pela UNIFAI e Licenciado para docência em cursos profissionalizantes em 2010 pela UNISUL. Tem pós graduação em planejamento e docência no ensino superior pela ESAB e mestrando da UNICAMP na área de projetos mecânicos. Recentemente selecionado para cursar o doutorado no Instituto de Pesquisas de Energia Nuclear (IPEN). Atuou durante vários anos na gerência de manutenção de frotas, oficinas de reparação automotiva e desenvolvimento de equipamentos para oficinas. Também atua como perito judicial e colunista/consultor técnico free lancer em publicações técnicas. Landulfo é autor do livro “Manual completo do Automóvel”, que será lançado em 2014, pela Editora Hemus.

Carolina Vilanova, editora da Revista e Portal Oficina News, é jornalista (Mtb 26.048) e trabalha desde de 1996 na imprensa editorial automotiva. Em 2003 iniciou sua participação no mercado da reparação e reposição automotiva, inclusive como editora da Revista o Mecânico por 12 anos. No ano de 2014, idealizou o Portal Oficina News, que em 2016 teve sua versão impressa publicada, a Revista Oficina News, sob a chancela da Editora Ita & Caiana. Sob sua responsabilidade editorial, publica também a Revista Frete Urbano.